DOURTINA DA IGREJA (Eclesiologia)


 


I. A NATUREZA DA IGREJA

A igreja é a comunidade de todos os cristãos de todos os tempos. Essa definição compreende que a igreja é feita de todos os verdadeiramente salvos. Paulo afirma: “Cristo amou a igreja e entregou-se a si mesmo por ela” (Ef 5.25). Aqui o termo “a igreja” é usado para referir-se a todos aqueles pelos quais Cristo morreu para redimir, todos os salvos pela morte de Cristo. Isso, porém, inclui todos os verdadeiros cristãos de todos os tempos, tanto os salvos do Novo como os do Antigo Testamento. O plano de Deus para a igreja é tão grande que ele exaltou Cristo a uma posição de suprema autoridade por amor à igreja: “E pôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Ef 1.22-23).

1.2. A igreja é invisível, ainda que visível.

Em sua realidade verdadeiramente espiritual como a comunidade de todos os cristãos genuínos, a igreja é invisível. Isso se dá porque não podemos ver a condição espiritual do coração de ninguém. Podemos ver os que freqüentam a igreja e perceber sinais externos de uma mudança espiritual interior, mas não podemos de fato ver o coração das pessoas nem enxergar o estado espiritual em que se encontram – algo que só Deus pode fazer. Foi por isso que Paulo afirmou: “O Senhor conhece os que lhe pertencem” (2Tm 2.19). Mesmo em nossas igrejas e em nossa vizinhança só Deus sabe, com toda a certeza e sem errar, quem são os verdadeiros cristãos. Falando da igreja como invisível, o autor de Hebreus fala da “assembléia (literalmente, “igreja”) dos primogênitos arrolados no céu” (Hb 12.23) e diz que os cristãos do presente unem-se àquela assembléia em adoração.

1.3. A igreja é local e universal.

No Novo Testamento a palavra “igreja” pode ser aplicada a um grupo de cristãos de qualquer tamanho, desde um pequeno grupo que se reúne sempre em uma residência até o grupo de todos os cristãos na igreja universal. A igreja numa casa é chamada “igreja” em Romanos 16.5 (“saudai igualmente a igreja que se reúne na casa deles”) e 1Coríntios 16.19 (“No Senhor, muito vos saúdam Áqüila e Priscila e, bem assim, a igreja que está na casa deles”.) A igreja de uma cidade inteira é também chamada “igreja” (1Co 1.2; 2Co 1.1 e 1Ts 1.1). A igreja de determinada região é chamada “igreja” em Atos 9.31: “A igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria.” Finalmente, a igreja do mundo inteiro pode ser chamada “a igreja”. Paulo afirma: “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25)”, e diz: “A uns estabeleceu Deus na igreja, primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres...” (1Co 12.28). Nesse último versículo, a menção de “apóstolos”, os quais não foram dados a nenhuma igreja em particular, garante que a referência seja à igreja universal.

1.4. Metáforas da igreja.

Para ajudar-nos a entender a natureza da igreja, as Escrituras usam uma ampla variedade de metáforas e imagens que descrevem a igreja. Há diversas imagens de família: por exemplo, Paulo vê a igreja como uma família quando diz a Timóteo que agisse como se todos os membros da igreja fossem membros de uma família maior: “Não repreendas ao homem idoso; antes, exorta-o como a pai; aos moços, como a irmãos; às mulheres idosas, como a mães; às moças, como a irmãs, com toda a pureza” (1Tm 5.1-2). Deus é o nosso pai celestial (Ef 3.14), e nós somos seus filhos e suas filhas, pois Deus nos diz: “Serei vosso Pai, e vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso” (2Co 6.18). Somos, portanto, irmãos e irmãs uns dos outros na família de Deus (Mt 12.49-50; 1Jo 3.14-18). Uma metáfora de família um pouco diferente é vista quando Paulo refere-se à igreja como a noiva de Cristo.
Ele diz que o relacionamento entre marido e mulher “refere-se a Cristo e à igreja” (Ef 5.32) e afirma que traz à tona o noivado entre Cristo e a igreja de Corinto e que isso se assemelha a um noivado entre uma noiva e seu futuro marido: “Visto que vos tenho preparado para vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo” (2Co 11.2) – aqui Paulo está olhando para a época da volta de Cristo como a ocasião quando a igreja será apresentada a ele como noiva.

1.5. A igreja e Israel.

Entre os protestantes evangélicos tem havido diferença de posição sobre a questão do relacionamento entre Israel e a igreja. Essa questão foi trazida à tona como proeminente pelos que defendem um sistema teológico “dispensacionalista”. A mais extensa teologia sistemática escrita por um dispensacionalista, a Systematic Theology de Lewis Sperry Chafer, destaca muitos aspectos distintos entre Israel e a igreja, e até mesmo entre o Israel fiel do Antigo Testamento e a igreja do Novo Testamento. Chafer argumenta que Deus tem dois planos distintos para dois diferentes grupos de pessoas que ele redimiu: os propósitos e as promessas de Deus para Israel são bênçãos terrenais e serão cumpridos nesse mundo em algum tempo no futuro.
Por outro lado, os propósitos e as promessas de Deus para a igreja são bênçãos celestiais, as quais serão cumpridas no céu. Essa distinção entre os dois diferentes grupos que Deus salva será vista especialmente no milênio, conforme Chafer, pois naquela ocasião Israel reinará na terra como povo de Deus e desfrutará o cumprimento das promessas do Antigo Testamento, mas a igreja já terá sido levada para o céu na ocasião da volta secreta de Cristo para os seus santos (“o arrebatamento”). Conforme essa posição, a igreja não começou antes do Pentecostes (At 2). E não é correto pensar nos salvos do Antigo Testamento com os do Novo Testamento como partes de uma igreja.

1.6. A igreja e o reino de Deus.

Qual é o relacionamento entre a igreja e o reino de Deus? As diferenças foram bem resumidas por George Ladd:
O reino é primeiramente o governo dinâmico ou o domínio real de Deus e, derivando dessa idéia, a esfera na qual o domínio é experimentado. Na linguagem bíblica, o reino não é identificado com os seus súditos. Eles são o povo do domínio de Deus que adentram o reino, nele vivem, e por ele são governados. A igreja é a comunidade do reino, mas nunca o reino em si. Os discípulos de Jesus pertencem ao reino assim como o reino pertence a eles; todavia, eles não são o reino. O reino é o domínio de Deus; a igreja é uma sociedade de homens.
Ladd prossegue até resumir cinco aspectos específicos do relacionamento entre o reino e a igreja: (1) A igreja não é o reino (pois Jesus e os primeiros cristãos pregaram que o reino de Deus estava próximo e não que a igreja estava próxima; eles pregaram as boas novas do reino e não as boas novas da igreja: At 8.12; 19.8; 20.25; 28.23, 31). (2) O reino cria a igreja (porque quando as pessoas entram no reino de Deus elas unem-se a uma comunhão humana da igreja). (3) A igreja testemunha do reino (pois Jesus disse: “E será pregado esse evangelho do reino por todo o mundo”, Mt 24.14). (4) A igreja é o instrumento do reino (porque o Espírito Santo, manifestando o poder do reino, age por meio dos discípulos para curar os enfermos e expulsar demônios, conforme fez no ministério de Jesus: Mt 10.8; Lc 10.17). (5) A igreja é a guardiã do reino (porque à igreja foram dadas as chaves do reino dos céus: Mt 16.19).

II. O Governo da Igreja

As igrejas hoje têm muitas diferentes formas de governo. A Igreja Católica Romana tem um governo mundial sob a autoridade do papa. As igrejas episcopais têm bispos com autoridade regional e, acima deles, arcebispos. As igrejas presbiterianas dão autoridade regional aos presbitérios e autoridade nacional aos concílios. Todavia, as igrejas batistas e muitas outras igrejas independentes não têm uma autoridade oficial de governo além da congregação local, e a filiação a outras denominações é voluntária.

2.1 Os oficiais da Igreja

Um oficial da igreja é alguém publicamente reconhecido como detentor do direito e da responsabilidade de desempenhar certas funções para o benefício de toda a igreja.
Segundo essa definição, presbíteros e diáconos seriam considerados oficiais na igreja, bem como o pastor (se esse for um ofício distinto). O tesoureiro e o moderador também seriam oficiais (esses títulos podem variar de igreja para igreja). Todas essas pessoas tiveram reconhecimento público, geralmente em um culto no qual foram “empossados” ou “ordenados” em um ofício.

2.11. Apóstolos.

No início deste livro vimos que os apóstolos do Novo Testamento tinham um tipo singular de autoridade na igreja primitiva: autoridade para falar e escrever palavras que eram “palavras de Deus” em sentido absoluto. Não acreditar neles ou desobedecer a eles era o mesmo que não crer em Deus e desobedecer a Deus. Os após-tolos, portanto, tinham autoridade para escrever palavras que se tornaram palavras da Bíblia. Este fato por si só nos sugere que havia algo de singular no ofício de apóstolo, e não esperaríamos que ele continuasse hoje, porque atualmente ninguém pode acrescentar palavras à Bíblia e tê-las na conta de palavras de Deus ou como parte das Escrituras.
a. As qualificações de um apóstolo. As duas qualificações de um apóstolo eram: (1) ter visto Jesus Cristo após a ressurreição (ser testemunha ocular da ressurreição) e (2) ter sido especificamente comissionado por Cristo como seu apóstolo.
O fato de que um apóstolo tinha de ter visto o Senhor ressurreto é indicado em Atos 1.22, onde Pedro diz que o substituto de Judas deve “se tornar testemunha conosco de sua ressurreição”. Além disso foi “aos apóstolos que escolhera” que “depois de ter padecido se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis, aparecendo-lhes durante quarenta dias” (At 1.2-3; cf. 4.33).
b. Quem eram os apóstolos? O grupo inicial contava com doze – os onze discípulos originais que continuaram após a morte de Judas, e Matias, que o substituiu: “E os lançaram em sortes, vindo a sorte a recair sobre Matias, sendo-lhe então votado lugar com os onze apóstolos” (At 1.26). Tão importante era esse grupo original de doze apóstolos, os membros fundadores do ofício apostólico, que lemos que seus nomes estão escritos nos fundamentos da cidade celestial, a nova Jerusalém: “A muralha da cidade tinha doze fundamentos, e estavam sobre estes os doze nomes dos doze apóstolos do Cordeiro” (Ap 21.14).
c. Resumo. A palavra apóstolo pode ser usada em um sentido amplo ou restrito. Em sentido amplo ela significa “mensageiro” ou “missionário pioneiro”. Mas em sentido restrito, que é o mais comum no Novo Testamento, refere-se a um ofício específico, “apóstolo de Jesus Cristo”. Esses apóstolos tinham autoridade única para fundar e liderar a igreja primitiva e podiam falar e escrever a palavra de Deus. Muitas de suas palavras escritas tornaram-se as Escrituras do Novo Testamento.       

2.1.2. Presbíteros (pastores / bispos)

a. Pluralidade de presbíteros, padrão em todas as igrejas do Novo Testamento. O próximo ofício a ser considerado é o de “presbítero”. Embora se argumente que havia diferentes formas de governo eclesiástico no Novo Testamento, um panorama dos textos pertinentes mostra que o oposto é verdadeiro: há um padrão bastante coerente de vários presbíteros como o principal grupo de liderança das igrejas neotestamentárias. Por exemplo, em Atos 14.23 lemos: “E promovendo-lhes em cada igreja a eleição de presbíteros, depois de orar com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido”. Isso aconteceu na primeira viagem missionária de Paulo, quando retornava pelas cidades de Listra, Icônio e Antioquia, e indica que o procedimento normal de Paulo desde sua primeira viagem missionária era estabelecer um grupo de presbíteros em cada igreja que fundava. Sabemos que Paulo também estabeleceu presbíteros na igreja de Éfeso, porque lemos: “De Mileto mandou a Éfeso chamar os presbíteros da igreja” (At 20.17).
b. Outros títulos dos presbíteros: pastores ou bispos. Presbíteros também são chamados “pastores” ou “bispos” no Novo Testamento. A palavra menos usada (pelo menos na forma substantiva) é pastor (gr. poimÂn). Pode surpreender-nos descobrir que essa palavra, que se tornou tão comum, só ocorra, referindo-se a um oficial da igreja, uma vez no Novo Testamento. Em Efésios 4.11, Paulo escreve: “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, outros para pastores e mestres”. O versículo provavelmente seria mais bem traduzido por “pastores-mestres” (um grupo) e não “pastores e mestres” (sugerindo dois grupos) por causa da construção grega (embora nem todo estudioso da área de Novo Testamento concorde com a tradução).  A associação com o ensino sugere que esses pastores eram alguns presbíteros (ou talvez todos) que se encarregavam do ensino, porque um dos requisitos do presbítero era ser “apto para ensinar” (1Tm 3.12).
c. As funções dos presbíteros. Uma das principais funções dos presbíteros é dirigir as igrejas do Novo Testamento. Em 1Timóteo 5.17 lemos: “Devem ser considerados merecedores de dobrados honorários os presbíteros que presidem bem”. Antes, na mesma epístola, Paulo diz que o bispo (ou presbítero) “deve governar bem a sua própria casa [...] pois, como cuidará da igreja de Deus?” (1Tm 3.4-5).
d. Qualificações dos presbíteros. Quando Paulo alista as qualificações dos presbíteros, é importante o fato de ele juntar requisitos concernentes a traços do caráter e atitudes íntimas com requisitos que não podem ser preenchidos em curto espaço de tempo, senão em um período de muitos anos de vida cristã fiel:
“E necessário, portanto, que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma só mulher, temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro, apto para ensinar; não dado ao vinho, não violento, porém cordato, inimigo de contendas, não avarento; e que governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o respeito (pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da igreja de Deus?); não seja neófito, para não suceder que se ensoberbeça e incorra na condenação do diabo” (1Tm 3.2-7).
e. Que significa “esposo de uma só mulher”? A qualificação esposo de uma só mulher” (1Tm 3.2; Tt 1.6) tem sido entendida de diferentes formas. Alguns pensam que exclui do ofício de presbítero aqueles que, tendo-se divorciado, casaram-se com outra mulher, porque, neste caso, seriam marido de duas mulheres. Mas essa não parece ser uma interpretação correta desses versículos. Uma interpretação melhor é que Paulo estava proibindo um polígamo (alguém que tem mais de uma esposa ao mesmo tempo) de ser presbítero. Há vários motivos para essa interpretação:
(1) Todas as outras qualificações alistadas por Paulo referem-se ao estado presente de um homem, não a toda sua vida passada. Por exemplo, 1Timóteo 3.1-7 não significa “aquele que nunca foi violento”, mas “aquele que não é violento agora, mas gentil”. Não significa “aquele que nunca foi amante do dinheiro”, mas “aquele que não é amante do dinheiro agora”. Não significa “aquele que sempre foi irrepreensível”, mas aquele que “agora é irrepreensível”. Se estendêssemos essas qualificações à vida pregressa das pessoas, excluiríamos quase todos que se tornaram cristãos quando adultos, porque é duvidoso que qualquer não cristão preenchesse esse requisitos.
(2) Caso quisesse, Paulo poderia ter dito “casado só uma vez”, mas não o fez.
(3) Não impedimos viúvos que se casaram de novo de serem presbíteros, mas deveríamos, se entendêssemos a frase como “casado só uma vez”. As qualificações para presbíteros são todas baseadas no caráter moral e espiritual, e nada há na Bíblia que dê a entender que um viúvo que se casou de novo seja moral ou espiritualmente inferior.
(4) A poligamia era possível no primeiro século. Embora não fosse comum, ela era praticada, especial-mente entre os judeus. O historiador judeu Josefo diz: “Porque é nosso costume antigo ter diversas esposas ao mesmo tempo”. A legislação rabínica também regulamentava costumes de herança e outros aspectos de poligamia.
f. A ordenação pública de presbíteros. Em relação com a discussão acerca dos presbíteros, Paulo diz: A ninguém imponhas precipitadamente as mãos” (1Tm 5.22). Embora o contexto não especifique um processo de seleção de presbíteros, todo o contexto imediatamente anterior (1Tm 5.17-21) trata de presbíteros; e a imposição de mãos seria uma cerimônia para separar alguém para o ofício de presbítero (observe a imposição de mãos para ordenar ou estabelecer pessoas em certos ofícios e tarefas em At 6.6; 13.3; 1Tm 4.14). Portanto, a consagração de presbítero parece a possibilidade mais provável para a ação que Paulo tem em mente. Nesse caso ele estaria dizendo: “A ninguém consagre precipitadamente como presbítero”. Isso seria coerente com um processo por onde os diáconos devem ser “primeiramente experimentados; e, se se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato” (1Tm 3.10).

2.1.3. Diáconos.

A palavra diácono é tradução da palavra grega diakonos, que é o termo comum que se traduz por “servo”, quando usado em contextos não eclesiásticos.
Os diáconos são claramente mencionados em Filipenses 1.1: “... a todos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e diáconos que vivem em Filipos”. Mas não há especificação de sua função, só a indicação de que são diferentes dos bispos (presbíteros). Os diáconos também são mencionados em 1Timóteo 3.8-13 em uma passagem mais extensa:
“Semelhantemente, quanto a diáconos, é necessário que sejam respeitáveis, de uma só palavra, não inclinados a muito vinho, não cobiçosos de sórdida ganância, conservando o mistério da fé com a consciência limpa. Também sejam estes primei-ramente experimentados; e, se se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato. Da mesma sorte, quanto a mulheres [ou “esposas”; a palavra grega pode ter um desses significado], é necessário que sejam elas respeitáveis, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo. O diácono seja marido de uma só mulher, e governe bem seus filhos e a própria casa. Pois os que desempenharem bem o diaconato alcançam para si mesmos justa preeminência e muita intrepidez na fé em Cristo Jesus” (1Tm 3.8-13).

2.1.4. Outros cargos?

Em algumas igrejas hoje, há outros cargos, tais como tesoureiro, moderador (alguém com responsabilidade de presidir as reuniões administrativas da igreja), ou curador (em algumas formas de governo da igreja, alguém legalmente responsável pelas propriedades da igreja). Além disso, igrejas com uma equipe de direção com mais de um membro assalariado podem ter nessa equipe membros (tais como ministro de música, diretor de educação, conselheiro de jovens, etc.) “publicamente reconhecidos como detentores do direito e da responsabilidade de desempenhar certas funções na igreja” e que assim se encaixam em nossa definição de oficial da igreja, podendo até serem pagos para desempenhar tais funções em tempo integral, mas que podem não ser presbíteros nem diáconos na igreja.

III. O Poder da Igreja

Quando olhamos para os governos do mundo e para outras organizações educacionais e empresariais que possuem grande influência, e então consideramos nossas igrejas locais, ou até mesmo nossas sedes denominacionais, a igreja pode parecer-nos fraca e ineficiente. Além disso, quando reconhecemos o rápido crescimento do mal visto diariamente em nossa sociedade, podemos duvidar se a igreja tem poder para fazer quaisquer mudanças.
Por outro lado, em alguns países a igreja oficialmente reconhecida tem grande influência sobre o andamento das questões nacionais. Isso é certamente verdadeiro no caso da influência da Igreja Católica Romana em tempos passados em alguns países do sul da Europa e da América Latina (e até certo ponto isso ocorre ainda hoje). Tal foi o caso da Igreja da Inglaterra nos séculos anteriores e da igreja de João Calvino em Genebra, na Suíça, enquanto ele era vivo, e da igreja fundada pelos peregrinos em 1620 na colônia da baía de Massachusetts. Situações como essas nas quais a igreja parece ter grande influência levam-nos a perguntar se as Escrituras colocam alguma limitação sobre o poder da igreja.

3.1. A Batalha Espiritual

Paulo lembra aos coríntios: “Porque, embora andando na carne, não militamos segundo a carne. Porque as armas da nossa milícia não são carnais, e sim poderosas em Deus, para destruir fortalezas” (2Co 10.3-4). Entre essas armas usadas contra forças demoníacas que impedem a propagação do evangelho e o avanço da igreja encontram-se oração, adoração, autoridade para repreender forças demoníacas, as palavras das Escrituras, fé e retidão de conduta por parte dos membros da igreja. (Paulo dá mais detalhes sobre o nosso combate espiritual e sobre a armadura própria para isso em Ef 6.10-18).

3.2. As chaves do Reino


A frase “as chaves do reino” ocorre apenas uma vez na Bíblia, em Mateus 16.19, onde Jesus diz a Pedro: “Dar-te-ei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus”. Qual é o significado dessas “chaves do reino dos céus”?
Em outras passagens do Novo Testamento, chave sempre implica autoridade para abrir uma porta e permitir entrada para certo lugar ou esfera. Jesus afirma: “Ai de vós, intérpretes da lei! Porque tomastes a chave da ciência; contudo vós mesmos não entrastes e impedistes os que estavam entrando” (Lc 11.52). Além disso, Jesus diz em Apocalipse 1.18: “Tenho as chaves da morte e do Inferno (Hades)”, indicando que ele tem autoridade para permitir a entrada e a saída dessas esferas. (Cf. também Ap 3.7; 9.1; 20.1; bem como a predição messiânica de Is 22.22.)

IV. O PODER DA IGREJA

O poder espiritual e a batalha espiritual que devem ser exercidos pela igreja. Mas deveria a igreja alguma vez usar da força física (armas e exércitos por exemplo) para levar a efeito suas missões? A frase normalmente usada para referir-se à idéia de luta física e desse mundo é “fazer uso da espada”.
Há diversas indicações nas Escrituras de que a igreja nunca deve fazer uso da espada para levar a efeito os seus propósitos na era da nova aliança. Esse foi um erro terrível cometido nas Cruzadas, quando os exércitos sustentados pela igreja marcharam pela Europa e pela Ásia para tentar reconquistar a terra de Israel. Nesses casos a igreja estava tentando usar a força física para conquistar vitórias em territórios deste mundo. Todavia Jesus afirmou: “O meu Reino não é deste mundo. Se fosse, os meus servos lutariam” (Jo 18.36 nvi). A igreja tem o poder das chaves, que é poder espiritual. Isso significa travar batalhas espirituais com armas espirituais, mas não usar o poder da espada para alcançar seus propósitos. “Porque as armas da nossa milícia não são carnais” (2Co 10.4).
4.1 Disciplina Eclesiástica

Visto que a disciplina eclesiástica é um aspecto do uso do poder da igreja, é conveniente apresentar aqui uma discussão dos princípios bíblicos relevantes para a prática da disciplina eclesiástica.

a. O propósito da disciplina eclesiástica. Restauração e reconciliação do cristão que se está desviando. O pecado impede a comunhão com outros cristãos e com Deus. Para que haja reconciliação, o pecado precisa ser tratado. Portanto, o propósito principal da disciplina eclesiástica é alcançar o duplo alvo de restauração (levar o pecador ao comportamento correto) e de reconciliação (entre cristãos e com Deus). Assim como pais sábios disciplinam seus filhos (Pv 13.24: “Mas o que o ama [o filho], cedo, o disciplina”), e assim como Deus, nosso pai, disciplina a quem ama (Hb 12.6; Ap 3.19), também a igreja em sua disciplina age em amor para trazer de volta um irmão ou irmã que se tenha desviado, estabelecendo de novo tal pessoa em comunhão e livrando-a dos caminhos destrutivos da vida. Em Mateus 18.15, a esperança é que a disciplina pare no primeiro passo, quando alguém vai sozinho: “Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão”.  A frase “ganhaste a teu irmão” implica que aqueles que exercem a disciplina devem manter o alvo de reconciliação pessoal entre os cristãos sempre em mente. Paulo lembra-nos que devemos “restaurar” (nvi) o irmão (ou irmã) pecador “com espírito de brandura” (Gl 6.1), e Tiago incentiva-nos a “converter o pecador do seu caminho errado” (Tg 5.20).

b. Impedir que o pecado se espalhe, atingindo outros. Embora o primeiro alvo da disciplina eclesiástica seja restauração e reconciliação do crente que está no erro, nessa presente era a reconciliação e restauração nem sempre acontecerão. Mas quer ocorra a restauração, quer não, a igreja está ordenada a exercer disciplina, pois dois outros propósitos também estão em vista.
c. Proteger a pureza da igreja e a honra de Cristo. O terceiro propósito da disciplina eclesiástica é que a pureza da igreja deve ser protegida, para que Cristo não seja desonrado. Naturalmente, nenhum cristão, nessa era, tem o coração completamente puro, e todos nós temos algum pecado que permanece em nossa vida. Mas quando um membro da igreja permanece em pecado de maneira indubitavelmente óbvia para os outros, em particular para os descrentes, isso traz, sem dúvida, desonra a Cristo. É semelhante à situação dos judeus que desobedeciam à lei de Deus e levavam descrentes a ridicularizar e a blasfemar o nome de Deus (Rm 2.24: “O nome de Deus é blasfemado entre os gentios por vossa causa”).

4. 2. Por causa de quais pecados a disciplina eclesiástica deve ser exercida?

Por um lado, o ensino de Jesus em Mateus 18.15-20 fala-nos que se uma situação que envolve um pecado de alguém contra outrem não pode ser resolvido em uma reunião privada ou de um grupo pequeno, o assunto deve, então, ser levado à igreja:
Se teu irmão pecar contra ti, vai argüi-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que, pelo depoimento de duas ou três testemunhas, toda palavra se estabeleça. E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano (Mt 18.15-17).

Nesse caso o assunto avançou de uma situação particular e informal para um processo de disciplina público e muito mais formal, feito pela igreja inteira.

4.3. Como deve ser exercida a disciplina eclesiástica?

a. O conhecimento do pecado deve ser preservado dentro do menor grupo possível. Esse parece ser o propósito de Mateus 18.15-17, que está por trás do avanço gradual que começa numa reunião privada, passa para uma reunião com duas ou três pessoas e chega à revelação a toda a igreja. Quanto menos pessoas souberem de algum pecado, melhor, pois é mais fácil haver arrependimento, um número menor de pessoas se desvia, e a reputação da pessoa envolvida, da igreja e de Cristo é menos prejudicada.
b. Medidas disciplinares devem ser cada vez mais severas até que haja uma solução. Uma vez mais em Mateus 18 Jesus nos ensina que não podemos parar simplesmente em uma conversa privada se essa não trouxer resultados satisfatórios. Ele exige que o pessoa ofendida vá primeiro sozinha, e então leve mais uma ou duas outras pessoas (Mt 18.15-16). Além disso, se um cristão acha que ofendeu alguém (ou se alguém acha que foi ofendido), Jesus exige que a pessoa que cometeu o erro (ou que se acredita ter errado) vá à pessoa que se considera vítima do erro cometido (Mt 5.23). Isso significa que se fomos ofendidos ou outros acham que foram ofendidos, sempre é nossa responsabilidade tomar a iniciativa e ir falar com a outra pessoa. Jesus não nos permite que esperemos a outra pessoa vir falar conosco.
c. A disciplina dos líderes da igreja. Em uma passagem Paulo apresenta diretrizes concernentes à disciplina dos líderes da igreja:
Não aceites denúncia contra presbítero, senão exclusivamente sob o depoimento de duas ou três testemunhas. Quanto aos que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam. Conjuro-te, perante Deus, e Cristo Jesus, e os anjos eleitos, que guardes estes conselhos, sem prevenção, nada fazendo com parcialidade (1Tm 5.19-21).

Paulo apresenta aqui uma cautela especial a fim de proteger os líderes de ataques individuais: uma medida com respeito ao pecado, nesse caso, exige o depoimento de duas ou três testemunhas. “Os que vivem no pecado” devem ser repreendidos “na presença de todos”. A razão disso é que o mau exemplo da conduta pecaminosa dos líderes terá muito provavelmente o efeito negativo que se disseminará nos outros que vêem a vida deles. Assim Paulo aconselha Timóteo a “nada fazer com parcialidade” em tal situação, advertência muito útil, já que Timóteo era provavelmente muito amigo de vários líderes da igreja de Éfeso.
d. Outros aspectos da disciplina eclesiástica. Uma vez que a disciplina seja exercida, tão logo haja arrependimento em qualquer estágio do processo, os cristãos cientes da disciplina devem receber de coração o arrependido na comunhão da igreja com rapidez. Paulo afirma: “De modo que deveis, pelo contrário, perdoar-lhe e confortá-lo, para que não seja o mesmo consumido por excessiva tristeza [...] Pelo que vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor” (2Co 2.7-8; cf. 7.8-11). Uma vez mais, nosso propósito na disciplina eclesiástica nunca deve ser punir alguém com um desejo de vingança, mas sempre restaurá-lo e curá-lo.

V. OS SACRAMENTOS


Os Sacramentos instituídos por Cristo não são unicamente designações ou indícios da profissão dos cristãos, mas antes testemunhos certos e firmes, e sinais eficazes da graça e da boa vontade de Deus para conosco, pelos quais ele opera invisivelmente em nós, e não só vivifica, mas também fortalece e confirma a nossa Fé nele.
São dois os Sacramentos instituídos por Cristo nosso Senhor no Evangelho, isto é, o Batismo e a Ceia do Senhor.
Os cinco vulgarmente chamados Sacramentos, isto é, Confirmação, Penitência, Ordens, Matrimônio, Extrema Unção, não devem ser contados como Sacramentos do Evangelho, tendo em parte emanado de uma viciosa imitação dos Apóstolos, e sendo em parte estados de vida aprovados nas Escrituras; não têm, contudo, a mesma natureza de Sacramentos peculiar ao Batismo e à Ceia do Senhor, porque não têm sinal algum visível ou cerimônia instituída por Deus.
Os Sacramentos não foram instituídos por Cristo para servirem de espetáculo, ou para serem levados em procissão, mas sim para os utilizarmos da forma devida. É só nas pessoas que dignamente os recebem é que há um saudável efeito ou operação; mas os que indignamente os recebem adquirem para si mesmos a condenação, como diz São Paulo.
O Batismo não é um sinal de profissão, e marca de diferença, com que se distinguem os Cristãos dos que o não são, mas também um sinal de Regeneração ou Novo Nascimento, pelo qual, como por instrumento, os que recebem o Batismo devidamente são enxertados na Igreja; as promessas da remissão dos pecados, e da nossa adoção como Filhos de Deus pelo Espírito Santo, são visivelmente marcadas e seladas, a Fé é confirmada, e a Graça, aumentada por virtude da oração a Deus.
O Batismo das Crianças deve conservar-se de qualquer modo na Igreja como sumamente conforme à instituição de Cristo.
A Ceia do Senhor não só é um sinal do mútuo amor que os cristãos devem ter uns para com os outros; mas antes é um Sacramento da nossa Redenção pela morte de Cristo, de sorte que para os que devida e dignamente, e com fé o recebem, o Pão que partimos é uma participação do Corpo de Cristo; e de igual modo o Cálice da Bênção é uma participação do Sangue de Cristo.
A Transubstanciação (ou mudança da substância do Pão e do Vinho) na Ceia do Senhor, não se pode provar pelas Escrituras Sagradas; mas antes repugna as palavras terminantes das Escrituras, subverte a natureza de Sacramento e tem dado ocasião a muitas superstições. O Corpo de Cristo é dado, tomado e comido na Ceia, somente de um modo celeste e espiritual. E o meio pelo qual Corpo de Cristo é recebido e comido na Ceia é a Fé.
O Sacramento da Ceia do Senhor não foi pela ordenança de Cristo reservado, nem levado em procissão, nem elevado, nem adorado.














REFERENCIA BIBLIOGAFICA



GRUDEM Wayne. Teologia Sistemática. Ed Vida Nova


LANGSTON, A.B. Esboço de Teologia Sistemática, JUERP, Rio de Janeiro 2000.

JOHANNES, B. Bauer. Dicionário de Teologia Bíblica, ed. Loyola.